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terça-feira, 25 de março de 2014

Direito de Família: como Combater a Alienação Parental

Autor: Yuri Carvalho Nazareth

Período: Acadêmica do 10º Período de Direito da Escola Superior Dom Helder Câmara





Quanto mais cedo se detectar e iniciar um trabalho de reparação para com o jovem alienado, melhores resultados serão encontrados. Trata-se de uma condição especial, um problema que afeta um menor que ainda não possui condições de diferir a verdade sendo facilmente enganado e, assim, acreditando fielmente naquele em que deposita sua total confiança.

Por mais grave que seja a denúncia, o fato narrado deve ser esclarecido por todos os meios possíveis, uma vez que em nosso país a mera suspeita não leva a uma condenação, cabendo o contraditório e a ampla defesa.

A verdade atingida pela justiça pública não pode e não deve valer em juízo sem que haja oportunidade de defesa ao indiciado. Assim, não se pode mais conceber o contraditório de maneira meramente formal, como simples requisito técnico de caráter não essencial, mas sim, o compreender como sendo realmente imprescindível para um processo justo. O diálogo judicial conquista dessa forma, lugar de destaque na formação do juízo, elevando a colaboração e cooperação das partes com o órgão judicial e deste com as partes, consoante as regras formais do processo. (ALMEIDA, 1973, p. 86).

Todas as partes devem ser ouvidas, não se levando pela emoção contida em muitos casos, como, por exemplo,  na denúncia de abuso sexual, onde o clamor por resposta e punição deve ser posto em segundo plano, havendo o dever primário pela verdade. Distinguir a forma como a parte tenta ludibriar o juízo e a puni-la por isso resguardando o interesse das vítimas é crucial.

Direito de defesa, de elucidar fielmente os fatos sem deixar a emoção tomar conta, uma tarefa difícil,  mas inerente aos nossos juízes, que, com perspicácia devem lidar com os casos e punir duramente os culpados.

A Alienação Parental ocorre na família e a mesma, assim que notar tais sintomas,  pode tomar medidas de coibição, não prosperando com informações danosas ao jovem que podem afetá-lo pela vida adulta e influenciar suas escolhas. Vale ressaltar novamente no presente ponto que, quanto mais cedo se descobrir e coibir a alienação, menores serão os danos causados a todos os envolvidos.

A criança e o genitor vítima da alienação  são o elo fraco da relação, devendo o laço afetivo afetado ser restabelecido e aquele que culminou para isso ser devidamente punido. Justiça em primeiro lugar com o devido resguardo à criança, uma tarefa complicada e complexa para nossos juízes e demais profissionais que lidam com os casos.

Fonte: http://www.domtotal.com/

O direito de família e a questão da alienação parental

Autores: 
Gisele Leite
Denise Heuseler

O Direito de Família, entre todos os ramos do Direito Civil, é aquele que mais envolve nossa afetividade e abarca nossas relações e vidas.

A família é a célula mater da sociedade humana cuja relevância é revelada pela própria tutela oferecida pela atual e vigente Constituição Federal Brasileira.

Embora que a família não se reconheça personalidade jurídica, sendo uma entidade amorfa e não possa sofrer a desconsideração da personalidade jurídica.

DestacaJacques Lacan que a família desempenha primordial papel na transmissão da cultura nos grupos humanos. É exatamente na família que temos a sede de nossa primeira educação, onde aprendemos a reprimir os instintos, adquirimos a linguagem, fixando tradições, ritos e costumes.

É a família enfim a responsável em dar continuidade psíquica entre as gerações, revestindo-se de alta significação psicológica, jurídica e social.

 E desde que deixou de ser o principal núcleo econômico e de reprodução para então se transformar no espaço de afeto e do amor, surgiram várias modalidades sociais de família e que transcende aos meros laços sanguíneos e genéticos e abraça finalmente o âmbito sócio-afetivo.

O magistral Caio Mário da Silva Pereira em suas derradeiras edições bem apontou com base em Zannoni que “a família compreende uma determina categoria de relações sociais reconhecidas e, portanto institucionais.”

Dentro deste conceito, a família não deve necessariamente coincidir com uma definição estritamente jurídica. Não se podendo conceber um uniforme modelo social de família, por essa razão, o Projeto de Lei 2.285 de 2007 que é chamado de “Estatuto das Famílias” [1]contempla a melhor opção constitucional de ampla proteção das mais variadas entidades familiares.

Vide também o Projeto de Lei 674 de 2007 ( do divórcio de fato) e ainda o PL4508/2008( que proíbe a adoção por homossexual) e ainda o PL 5266/2009 ( que trata da filiação resultante da fecundação artificial heteróloga).

No passado e, em particular pelo Código Civil Brasileiro de 1916 apenas era considerada a família, aquela constituída pelo casamento. Pelo que galgava o adjetivo qualificador de “legítima” e, foi por muito tempo o único objeto de estudo do direito de família.

Hoje, no entanto, percebemos que a família é gênero que comporta diversas modalidades de constituição e todas obtém a proteção do  Direito.

Algumas considerações são necessárias sobre a normatização constitucional incidente particularmente sobre a família conforme alude o art. 226 da CF/1988 que aduz que “a família é a base da sociedade e efetivamente goza de proteção especial do Estado.”

E contempla ainda os arts. 227 ao 230 da Magna Carta vigente que imputa aos governos das três esferas( a saber: federal, estadual e municipal) cuidarem com prioridade estabelecendo metas sérias voltadas para as políticas públicas de apoio à família, em especial, a criança,o adolescente e o idoso.

Daí ser plenamente justificável à especial tutela traduzidas pelos vários Estatutos ( como o ECA e o Estatuto do Idoso) ou seja, pelas leis 8.069/1990 e 10.741/2003.

Importante é tecer a respeito da personalidade jurídica da família algumas explicações pertinentes principalmente com base em diferentes vertentes doutrinárias.

É evidente que contemporaneamente resta superada a corrente negativista que não reconhece existência à pessoa jurídica[2].

A teoria da ficção se desenvolveu a partir de Windscheid sobre o direito subjetivo e teve em Savigny seu principal defensor. Não reconhecia a existência real à pessoa jurídica, sendo considerada como mera abstração e criação da lei.

Uma vez que somente os sujeitos dotados de vontade poderiam titularizar direitos subjetivos ( tal tese se desenvolveu na Alemanha e França no século XVIII).

A principal crítica seria a criação do Estado que é, sem dúvidas, uma pessoa jurídica de direito público por excelência e tem sua existência legal antes mesmo que surgisse uma lei para que o expressamente o reconhecesse.

Portanto, o reconhecimento das pessoas jurídicas pelo Estado não confirma a criação, e sim, apenas a confirmação.

Já pela teoria da realidade objetiva apontava em sentido diametralmente oposto portanto, a pessoa jurídica não corresponde a mera abstração ou criação da lei. Posto que teria existência fática, real e social tal qual os indivíduos.

Imaginava que a pessoa jurídica tal como os grupos sociais, é resultante da conjugação de dois elementos: o corpus ( a coletividade) ou conjunto de bens e o animus ( a intenção ou vontade do instituidor). Um de seus maiores defensores fora Clóvis Beviláqua.

Outra teoria a explicar a natureza jurídica[3]da pessoa jurídica é a da realidade técnica e situa-se bem ao meio do caminho entre a tese da ficção e da realidade objetivo, posto que entende que sua existência real e a personalidade é conferida pelo direito.[4]

Desta forma, justifica-se a existência do Estado, associações, as sociedades existem como grupos constituídos para a realização de determinados fins. Trata-se de expediente da técnica jurídica e se admite sua capacidade jurídica própria.

A teoria da realidade técnica é a que possui melhor explanação para o tratamento dado à pessoa jurídica em nosso direito positivo. E, por meio da desconsideração da personalidade jurídica pode-se operar a suspensão legal de seus efeitos.

A outorga de personalidade jurídica às entidades lhes permite o livre estabelecimento das relações jurídicas lícitas, facilitando o comércio e demais atividades negociais.[5]

O vetusto Código Civil de 1916 em seu art. 20 já consignava que as pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros ou componentes, apesar de que o mesmo não fora reprisado no vigente Código Civil Brasileiro.

Importante ressaltar que tal concepção, no entanto, permanece doutrinariamente válida, ressalvando-se os casos de desconsiderações baseadas em geral no desvio de sua finalidade social.

Mas, a família é sabido não é pessoa jurídica, não sendo dotada de personalidade jurídica e nem dispõe de ato constitutivo, representantes, sócios ou associados, não possui igualmente patrimônio social e nem mesmo se submete a registro[6].

Porém, não se deve considerá-la como ente despersonalizado posto que não dotada de capacidade processual como é o caso do espólio, condomínio e da massa falida.

A família é apenas grupo social reconhecido e tutelado pelo Direito, não tendo personalidade jurídica e nem capacidade processual.

Não há necessidade de se atribuir personalidade jurídica, pois o direito contemporâneo tem admitido usualmente a existência e o respeito aos mais variados tipos de sujeitos de direito que são dotados de capacidade e legitimidade para o exercício, dispensando-se seu enquadramento como pessoa jurídica.

Apesar de a família não possuir personalidade jurídica esta aparece como titular de situações jurídicas de direito material como é o caso da Lei 5.859/72 que disciplina o trabalho doméstico.[7]

O princípio da dignidade da pessoa humana incide certamente nas relações de família, funcionando como cláusula geral principiológica, sendo assim valor fundamental à existência humana, segundo as suas possibilidades, expectativas, patrimoniais e afetivas e indispensáveis à sua realização pessoal e em busca da felicidade.

É preciso sempre frisar que o princípio da dignidade humana representa vetor estruturante de todo o sistema jurídico pátrio, significando a maior conquista dos últimos anos, não devendo ser banalizado e nem se transformar em mera panacéia jurídica.

Com razão o filósofo Robert Alexy recomenda que ao aplicar o referido princípio deve o intérprete atua consciente de que possui o ônus da argumentação jurídica e tem ainda a tarefa de construir racionalmente o fundamento discursivo de incidência do referido preceito. Descabe a brutal transposição mecânica sem direção ou sentido.( In Teoria da Argumentação Jurídica, São Paulo, Editora Landy, 2001).

Aliás, cogita-se firmemente na eficácia horizontal do princípio da dignidade da pessoa humana o que acarreta a incidência dos direitos e garantias fundamentais em todas as relações de Direito Privado.

Os seguidores da corrente da eficácia direta sustentam a imediata eficácia deste ao passo que os adeptos da corrente da eficácia indireta argúem a eficácia mediata e que seriam aplicada na ausência de norma ordinária (lacuna) ou segundo balizamento da própria norma infraconstitucional, como no caso de concretização dos conceitos abertos  conforme o princípio da operabilidade).

Em verdade, ambas correntes não se rivalizam apresenta vários pontos de interseção, a saber:

a) ultrapassa a concepção liberal-burguesa segundo a qual os direitos fundamentais só são oponíveis contra o Estado, pois tais direitos existem para garantir o indivíduo liberdade e autonomia e devem ser invocados sempre que houver lesão ou ameaça em seus bens jurídicos, seja ou não o Estado o autor da ofensa;

b) os direitos fundamentais expressam a ordem de valores objetiva e cujos efeitos normativos alcançam todo o ordenamento jurídico, é a chamada eficácia irradiante fruto fecundo do princípio da unidade da ordem jurídica;

c) em regra, aceita-se a vinculação direta quando se referir as entidades privadas detentoras de poder social, ou seja, quando se configurar uma clara relação de desnível como ocorre no Direito do Trabalho brasileiro, capaz de afetar a paridade da relação jurídica, nesse caso seria uma relação semelhante ao âmbito das relações particular- Estado.

Para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho no que concernem as relações familiares a eficácia dos direitos fundamentais deve obter incidência direta e imediata, especialmente quanto ao reconhecimento da tutela dos direitos da personalidade de cada um dos seus membros, como por exemplo o direito à liberdade de orientação afetiva e igualdade entre cônjuges e companheiros.

Para tanto é indispensável que exista um ambiente harmonioso entre os interesses da própria família, conforme o núcleo social e os interesses sociais de seus membros, com o propósito de garantir a efetividade desses direitos fundamentais.

Atribui-se valor prioritário e prevalente aos direitos de família devendo prosperar por razões de seriedade, de solidariedade ou de liberdade.

busilis é tornar conciliáveis e compatíveis os direitos fundamentais dentro da mesma formação social principalmente quando poucos são os instrumentos para a satisfação desses direitos.
A composição deve ser feita através da mesma tábua de valores constitucionalmente instituída. Conclui-se que é essa incidência irradiante do sistema normativo constitucional, para se permitir a realização dos interesses de cada membro do núcleo familiar seja considerado individualmente, sejam como um todo.

Classicamente definiu Clóvis Beviláqua o Direito de Família como:  “é complexo das normas que regulam a celebração do casamento, sua validade, e os efeitos que dele resultam, as relações pessoais e econômicas da sociedade conjugal, a dissolução desta, as relações entre pais e filhos, o vínculo de parentesco e os institutos complementares da tutela e curatela.”[8]

No Direito de família vão repercutir aqueles graves problemas que atraem as atenções de sociólogos e políticos ante o crescimento demográfico e a disparidade entre o aumento populacional e dos meios de produção alimentícia, o que faz surgir em debate a questão do controle de natalidade, preocupa também o Estado, é há uma disposição constitucional no art. 226, sétimo parágrafo que informa que o planejamento familiar é livre decisão do casal, fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável.

Portanto, contemporaneamente o Direito de Família ampliou definitivamente sua incidência não se limitando a disciplinar apenas as famílias inauguradas pelo casamento mas também todo e qualquer arranjo familiar (tipificado ou não).

Com o advento da Constituição Federal Brasileira de 1988 é defendida a prevalência do Direito de Família Constitucional. Principalmente porque o Código Civil de 1916 eivado do espírito patrimonialista, matrimonialista e patriarcal fora superado pelo vigente Código Civil de 2002, o que corrobora com a assertiva de Cristiano Chaves de Faria:

“A entidade familiar deve ser entendida, hoje como grupo social fundado, essencialmente, em laços de afetividade, pois outra conclusão não se pode chegar à luz do Texto Constitucional, especialmente do art. 1º, III que preconiza a dignidade da pessoa humana como princípio vetor da República Federativa do Brasil.”

Muito embora permaneça a discriminação quanto à concubina seja na seara do Direito de Família como na sucessória, quanto a prole não vige mais essa injusta distinção.

Embora o Direito de Família de fato contenha preceitos de ordem pública não se identifica com o Direito Público, tanto que a família, por toda sua extensa importância social por ser a base de toda a sociedade, o que requer certa intervenção de natureza institucional, em obediência aos interesses maiores de preservação dos direitos provenientes das relações jurídico-familiares.
Confessadamente o Direito de Família destoa do restante do direito privado ( principalmente por sua parca autonomia de vontade) com as exceções das separações e divórcios extrajudiciais a Lei 11.441/07, pela imperatividade de suas normas, todas essas coerentes com o propósito de manutenção e preservação dos direitos pessoais presentes nas relações familiares cujo o enfoque diverge em muito da livre movimentação das relações patrimoniais.

È verdade que a divisão do direito objetivo positivado que se desdobra em direito público e privado o que não possui grande relevância na prática jurídica.

E, muitos doutrinadores só enxergam a divisão apenas o útil para fins didáticos. De qualquer maneira, a doutrina é praticamente unânime em reconhecer a natureza privada do Direito de Família, especialmente quando procura propugnar pela igualdade de exercício de direitos, e procura conferir maior liberdade e autonomia aos partícipes das relações familiares, como aliás, vem acontecendo as novas conquistas quanto a equivalência dos gêneros (masculino e feminino) principalmente no campo da filiação, e nos novos modelos de formação familiar, na mais ampla liberdade de disposição patrimonial em face da possibilidade de alteração de regime de bens no casamento e, agora, recentemente com a possibilidade de separações e divórcios administrativos ou extrajudiciais realizados por escritura pública.
Concluímos que o Direito de Família integra sob o aspecto enciclopédico o Direito Privado apesar da cogência da grande maioria de seus institutos.

Um dos notáveis precursores da visão civil-constitucional um deles foi Paulo Lôbo, in litteris:

“As Constituições brasileiras reproduzem as fases históricas que o país viveu, em relação à família, no trânsito do Estado liberal para o Estado Social. As constituições de 1824 e 1891 são marcadamente liberais e individualistas, não tutelando as relações familiares. Na Constituição de 1891 há um único dispositivo ( art. 72, parágrafo quarto) com o seguinte enunciado: “ A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita”. Compreende-se a exclusividade do casamento civil, pois os republicanos desejavam concretizar a política de secularização da vida privada, mantida sob o controle da Igreja oficial e do direito do canônico durante a Colônia e o Império.

Em contrapartida, as Constituições do Estado social brasileiro ( de 1934 e 1988) democrático ou autoritário destinaram à família normas explícitas, aparecendo pela primeira vez a referência expressa à proteção especial do Estado, que será repetida nas constituições subsequentes.

Na Constituição autoritária de 1937 a educação surge como dever dos pais, filhos naturais são equiparados aos legítimos e o Estado assume a tutela das crianças, em caso de abandono[9]pelos pais.
A Constituição democrática de 1946 estimula a prole numerosa e assegura a assistência à maternidade, à infância e à adolescência.”( In Lôbo, Paulo Luiz. Família. 2ª edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2009, p.6).

Ganhou a família também uma funcionalização posto que reconhecidamente dotada de função social. E, não apenas, mas também a propriedade, o contrato, a empresa e até a responsabilidade civil.

No passado sob o pesado manto do conservadorismo e sob a pseudoestabilidade matrimonial existia a mulher degradada, filhos eram relegados ao segundo plano e, se houve a paralela formação de família a norma simplesmente bania esses indivíduos ( tanto a concubina como os filhos adulterinos) que eram visceralmente atirados no limbo jurídico da discriminação e do desprezo.

No momento e felizmente se reconhece à família constitucionalmente a sua função social principalmente voltada para a realização existencial do indivíduo, e por existir explicitamente o Estado Democrático do Direito calcado no princípio da dignidade da pessoa humana.

Com a constitucionalização[10]o papel desempenhado pela família principalmente com a inafastável repersonalização coloca a dignidade da pessoa humana no ápice do ordenamento jurídico corroborando efetivamente com a proteção da família independentemente de sua espécie.

A síndrome da alienação parental (SAP) foi elaborada por Richard Gardner que era professor do Departamento de Psiquiatria infantil da Faculdade da Columbia, em Nova York nos EUA em 1985:

“A síndrome de Alienação Parental (SAP) é um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tem nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor que faz a “lavagem cerebral”, programação e doutrinação e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo. Quando o abuso e/ou negligência parentais verdadeiros são presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental não é aplicável.”

Tal distúrbio pode afetar tanto crianças como adolescentes que são vítimas de interferência psicológica indevida realizada por um dos pais com o propósito de fazer com que repudie o outro genitor.

Há um jogo de lealdade, onde a criança é manipulada a rejeitar o outro para provar sua lealdade a outro genitor.
A doutrina estrangeira também menciona a HAP – Hostile Aggressive Parenting o que veio a ser denominada por AFH ou Ambiente Familiar Hostil que é uma situação muitas vezes tida como sinônima de alienação parental ou Síndrome do Pai Adversário

Porém, com esta não se confunde, vez que a alienação está ligada a situações envolvendo a guarda de filhos ou algo análogo por pais divorciados ou em vias de separação litigiosa, ao passo que a AFH ou ambiente hostil familiar seria mais abrangente e presente em quaisquer situações em duas ou mais pessoas ligadas à criança ou adolescente e que estejam divergindo sobre educação, valores, religião e, etc.

Enfim, divergem sobre o que seria o melhor para a criança ou adolescente. Na doutrina internacional uma das principais diferenças apontadas reside no fato que o AFH estaria ligado decisões concretas que afetam crianças e adolescentes, ao passo que a síndrome SAP se verifica relacionada com as questões voltadas à mente e ao fator psicológico.

E, por causa de seus devastadores efeitos, o legislador aprovou em 26 de agosto de 2010, a Lei 12.318 que dispõe sobre a alienação parental no Brasil.[11]
Só a guisa de comparação cabe registrar que nos EUA o obstáculo ao direito de visitação ao filho é considerado crime, enquanto que no Brasil não o é.

Define o art. 2º da referida lei que o ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie o genitor ou lhe cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

Adiante expõe o art. 3º que a prática de ato de alienação parental fere direito fundamental de ter convivência familiar saudável, prejudica a realização do afeto e constitui abuso moral contra a criança e o adolescente além de significar grave descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes da tutela ou guarda.

Exemplifica a lei quais condutas podem ser caracterizadas como alienação parental seja direta ou indiretamente realizada (por meio de terceiros), sem prejuízo de outros comportamentos ainda que não delineados em lei serem reconhecidos pelo juiz ou por perícia.

São atos de alienação parental: realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade, dificultar o exercício da autoridade parental ou o direito de visitação, a convivência familiar, ou omitir deliberadamente informações sobre o genitor, apresentar falsa denúncia contra o genitor, ou contra seus familiares, com o fito de obstar ou dificultar o contato com a criança ou adolescente.

Mudar de domicílio para local distante, sem justificativa, visando dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor e com demais familiares.

Em nível processual a fim de se aplicar sanções legais, não exigiu a lei prova suficiente da ocorrência dos atos de alienação parental que passam ser ilícitos, se contentando com meros indícios desses atos.

Sendo assegurado à criança e ao adolescente a garantia mínima da visitação assistida ressalvados os casos em que há riscos à sua integridade física ou psíquica ou mediante atestado profissional eventualmente designado pelo juiz para o acompanhamento de visitas.

A prioria exigência legal de mera matéria indiciária poderia parecer que afrontaria nosso sistema constitucional que prevê a ampla defesa, mas não procede tal entendimento posto que se objetiva dar a mais absoluta prioridade a defesa da própria criança e adolescente que são vítimas dessa terrível programação psicológica e que tanto dificulta a reconstrução fática da prova em juízo.

Cuidou ainda a nova lei[12]de fixar as sanções cabíveis a serem impostas ao alienador, sem prejuízo de se buscar sua responsabilização civil e criminal cabível. São especificadas tais sanções nos incisos do art. 6º que vai desde a advertência ao alienador até ao máximo da suspensão da autoridade parental.

Vindo mesmo inverter a obrigação de levar ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor. De qualquer forma será igualmente garantido o contraditório e a ampla defesa sob pena de nulidade processual.

Não prevê a referida lei o mínimo prazo para suspensão do poder familiar, o que faz presumir que pode perdurar até que o filho venha galgar a plena capacidade civil, caso em que, extingue-se o próprio poder familiar.

Também há a estipulação pecuniária de multa que não conta com apoio de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho até porque não surge o efeito sócio-afetivo esperado.
O que se visa com a aplicação da multa ao alienador é que deixe de praticar o comportamento nocivo. Infelizmente a jurisprudência pátria ainda é tímida[13]quanto ao reconhecimento da alienação parental e vale a pena citar alguns julgados no TJRS como Agravo de Instrumento 7001 481 44 79, Comarca de Sta. Vitória do Palmar/RS, rel. Des. Maria Berenice Dias em 07/06/2006.[14]

Já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo ser admissível pedido de guarda formulado por homossexual, considerando tratar-se de medida de natureza provisória que pode ser revogada se constatado o desvio na forma psicológica da menor ( RT 747/258).

Mais uma vez procurou-se a tutelar a criança e o adolescente e principalmente a necessidade de se ter uma convivência saudável mesmo no caso do rompimento das relações conjugais dos pais.

Prestigiando-se novamente o princípio da afetividade e da paternidade ou maternidade responsável.

Relata na excelente obra de Pablo Stolze Gagliano e de Rodolfo Pamplona Filho que seu amigo e co-autor que é magistrado trabalhista que mais de uma vez se deparou, em sede de consignatória de verbas trabalhistas onde a empresa disponibilizou os valores devido à extinção do contrato laboral de empregado falecido, trazendo para o pólo passivo por vezes, duas ou três mulheres, com que o referido trabalhador falecido mantinha simultaneamente relações amorosas assíduas e habituais, fornecendo-lhes a assistência material e muitas vezes conhecendo-se entre si as companheiras.

E, nesses casos é indispensável a atuação do órgão do Ministério Público do Trabalho principalmente em razão dos interesses dos filhos menores que todas tinham, principalmente para garantir equânime divisão entre os dependentes e o justo cálculo da meação.

O que nos remete ao tema complexo que é saber se a monogamia pode ser considerada como princípio em nosso ordenamento jurídico concernente as relações familiares. Em verdade, refletimos a fidelidade é um valor juridicamente tutelado e tanto o é que o mesmo é erigido como dever legal seja decorrente de casamento ou união estável.

Ademais a violação do dever de fidelidade aliada à insuportabilidade da vida em comum não somente pode resultar na dissolução da união conjugal ou estável como pode também admitir compensações indenizatórias.

Outra parte da doutrina no entanto, propõe situar a monogamia como princípio do direito de família[15]sendo um ponto crucial para as conexões morais e organizador das relações conjugais ( In Pereira, Rodrigo da Cunha. Uma Principiologia para o Direito de Família – Anais do V Congresso Brasileiro do Direito de Família, Belo Horizonte, IBDFAM, 2006, p. 848-9).

Todavia em respeito da intervenção mínima do Estado no Direito de Família, não há de impor coercitivamente a estrita observância da fidelidade recíproca. Portanto, é recomendável mormente entender a monogamia apenas como nota característica do nosso sistema jurídico, não a colocando como princípio em face principalmente de sua intensa carga normativa.

Gisele Leite
Denise Heuseler


Referências

GAGLIANO, Pablo Stolze. Rodolfo Pamplona Filho. Novo Curso de Direito Civil – Direito de Família, volume VI, 1ª edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2011.

TARTUCE, Fernando. José Fernando Simão. Direito Civil Série Concursos Públicos – Direito de Família, volume 5, 3ª edição, revista e atualizada, São Paulo. Editora Método. 2008.

MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume VI, Direito de Família. São Paulo. Editora Saraiva, 2005.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, Volume V, Direito de Família, 16ª. Edição, Atualizado por Tânia da Silva Pereira, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2006.

GOMES, Orlando. Direito de Família. 12ª edição, atualizada por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2000.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 5º volume. Direito de Família, 17ª edição. São Paulo, Editora Saraiva, 2002.

DA GAMA, Guilherme Nogueira. Direito Civil. Família. São Paulo, Editora Atlas, 2008.

TEPEDINO, Gustavo e Luiz Edson Fachin. Diálogos sobre Direito Civil, volumes I e II. Rio de Janeiro. Editora Renovar, 2008.

DELGADO, Mário Luiz e Jones Figueiredo Alves ( coord.) Novo Código Civil. Questões Controvertidas no direito de família e das sucessões. São Paulo, Editora Método, 2006.

VELOSO, Zeno. Código Civil Comentado, volume XVII. Direito de Família ( arts. 1694 a 1783). Coordenador Álvaro Villaça de Azevedo. São Paulo, Editora Atlas, 2008.

FARIAS de. Cristiano Chaves. Escritos de Direito de Família. Rio de Janeiro. Editora Lumen Juris, 2007.

LACAN, Jacques. Os complexos familiares na formação do indivíduo, ensaio de análise de uma função em Psicologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,  1985.



[1]  Aliás, atualmente se encontra apensado ao Projeto de Lei 674/2007, conforme se pode confirmar pelo sitehttp://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=373935.
[2]  As chamadas teorias negativistas defendidas por Brinz e Bekker que afirmavam tratar-se de mero patrimônio destinado a um fim. Ou mero patrimônio comum, como sustentaram Planiol, Wieland e Barthélemy.
[3]  Afirmar a natureza jurídica de algo, em linguagem simples, significa responder à pergunta: o que é isso para o direito? Em  qual categoria posso classificar tal ente ou fenômeno?
[4]Maria Helena Diniz prefere denominá-la de teoria da realidade das instituições jurídicas ( de Hauriou).
[5]  Silvio Venosa citando Ferrara adverte: “é por demais polêmica a conceituação da natureza jurídica da pessoa jurídica, e dela tem-se ocupado juristas de todas as épocas e campos do Direito. Posto que a conceituação se vê imersa por posições e paixões políticas e religiosas, e de qualquer modo sobre a matéria se produziu vasta literatura cujas teorias se interpenetram e se mesclam produzindo um emaranhado de posições sociológicas e filosóficas.
[6]  Os pressupostos existenciais da pessoa jurídica se reduzem basicamente a três: vontade humana criadora; a observância das condições legais para sua instituição e a licitude de seu objetivo.
[7]  Foi Savatier quem sustentou basicamente a idéia de ser a família sujeito de direitos, com autonomia em relação aos seus membros, e consequentemente encontrar-se investida da condição de pessoa moral.( In Les Métamorphoses Économiques et Sociales du Droit Civil d’Aujourd’hui, n. 110).
[8]  O direito de família é particularmente sensível a toda nova ambientação seja social quanto jurídica. Devida sua crescente publicização há uma tendência de retirá-lo do Direito Privado. Por essa razão já preconizavam os irmãos Mazeaud na promulgação de um Código de Família que reunisse todas as regras de direito privado e de direito público. A despatrimonialização se configura ao eleger a dignidade da pessoa humana como fundamento da República brasileira e subordinar as relações jurídicas existenciais, buscando o atendimento a sua função social.
[9]Em caso recente, a 8ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP fixou indenização por abandono afetivo do falecido pai, diante do intenso grau de culpa – mencionada a regra penal do dolo eventual – com que agiu durante a vida, negando a paternidade, o amparo e a afetividade, apesar da contundência dos indícios e provas (Ap. Cível n. 511.903-4/7-00). No mesmo sentido, outras Apelações Cíveis do TJ-SP, 301.246/1 e 410.524.4/0-00.

[10]Nessa esteira da constitucionalização do Direito de Família, aprovaram-se a Lei da Guarda Compartilhada (Lei 11.698/08), a “Lei Clodovil” (Lei 11.924/09), que permite ao enteado adotar o sobrenome do padastro, valorizando dessa forma a posse do estado de filho, a Emenda Constitucional do Divórcio ( 66/10) e a Lei que dispõe sobre a Alienação Parental (12.318/10).

[11]A aprovação do Projeto 4.053/08 e, consequentemente, a da Lei 12.318/10 ocorreu com alguns vetos: 1) Ao artigo 9º - Nega a apreciação por mecanismos extrajudiciais, como a mediação por tratar de direitos indisponíveis. Tal veto pode, entretanto, ser entendido como uma “cautela” tomada pelo Legislador ante a significativa ausência de mediadores capacitados ou peritos especializados.
Este quadro vem sendo alterado pela Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado dos Conflitos de Interesses, instituída pela Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça, que prevê a instalação de Núcleos e Centros de Conciliação e Mediação nos Estados, que, no relativo à capacitação, seguirá uma orientação única.
2) Ao artigo 10 - O Estatuto da Criança e do Adolescente já contempla mecanismos de punição, desnecessária a sanção de natureza penal. A intensidade do dolo ou o grau da culpa poderá permitir – dentro da previsão constitucional –, até mesmo, a prisão do alienador ou a colocação de tornozeleira eletrônica, para os reicindentes nos casos de mudança injustificada de domicílio.
A solução, após tentativas frustradas de conciliação ou mediação, através de pessoas leigas, ligadas ou não ao núcleo familiar doente, acaba por se endereçar ao Poder Judiciário e aqui cabe lembrar a sabedoria de Confúcio ao instituir o princípio do shuo full, segundo o qual há que se tentar por todos os meios uma solução conciliada, não adversarial, em questões de família, pois somente as pessoas despidas de bom-senso recorrem ao Judiciário.
Constata-se ademais que as medidas cautelares ou as definições liminares do conflito se mostram, em geral, apressadas e injustas, especialmente nos casos de acusação de abuso sexual, eis que a infraestrutura colocada à disposição do advogado para a propositura da ação e do magistrado para decidir de imediato mostra-se precária, insuficiente mesmo, a elaboração dos laudos ou dos indícios apresentados. ( vide in: http://www.conjur.com.br/2011-set-17/guardar-ou-alienar-sindrome-alienacao-parental)

[12]  Que completou mais de uma ano, vide http://www.conjur.com.br/2011-ago-26/lei-alienacao-parental-completa-ano-merece-comemoradaOs Tribunais pátrios prestigiaram a inovação legislativa, aplicando a norma com o fito de afastar a alienação parental (TJSP. Apelação nº 990.10.217.441-7, 4ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Natan Zelinschi de Arruda, j. 11.11.2010; TJRS. Agravo de Instrumento nº 70043065473, 8ª Câmara Cível, Rel. Des. Ricardo Moreira Lins Pastl, j. 14.07.2011; TJMG. Agravo de Instrumento nº 1.0024.09.644906-1/003, 1ª Câmara Cível, Rel. Des. Eduardo Andrade, j. 12.04.2011.
[13]  O STJ construi jurisprudência a respeito do tema, oprimeiro caso de alienação parental consiste num conflito de competência entre os juízos de direito de Paraíba do Sul (RJ) e Goiânia (GO). Diversas ações relacionadas à guarda de duas crianças tramitavam no juízo goiano, residência original delas. O juízo fluminense declarou ser competente para julgar uma ação ajuizada em Goiânia pela mãe, detentora da guarda das crianças, buscando suspender as visitas do pai (CC 94.723).Vide em: http://www.conjur.com.br/2011-nov-27/novidade-judiciario-alienacao-parental-jurisprudencia-stj

[14]  No tocante à guarda do filhos, tem-se  entendido que o deve predominar é o interesse dos menores, e no caso, nada aconselha fiquem eles em poder do pai, mesmo vencedor da lide, por permanecer, em regra, fora de caso o dia todo, podendo a apelante melhor cuidar da educação e criação de menores (RJTJSP, LEX 59/170).
Guarda. Adolescente. Encargo deferido ao irmão mais velho. Admissibilidade Entidade familiar formada pelos irmãos após o falecimento do pai. Estudos sociais realizados e a oitiva dos menores demonstram a formação de um núcleo coeso que mesmo com a falta da figura materna, conseguiu superar os desafios típicos da difícil adaptação e convivência. RT 786/268.
[15]  São vários os princípios do Direito de Família: o da proteção da dignidade da pessoa humana ( art. 1º,III da CF/88); da solidariedade familiar(art. 3º,I da CF/88, da igualdade entre os filhos ( art.227,§6º. Da CF/88 e art. 1.596 do CC); da igualdade entre os cônjuges e companheiros (art. 226,5º§ da CF/88 e art. 1.511 CC); da igualdade na chefia familiar; do maior interesse da criança e do adolescente, da proteção do idoso e da não intervenção ou da liberdade.

Fonte: http://egov.ufsc.br/

Poliamor é negado pelo Supremo e pelo STJ

Por Regina Beatriz Tavares


São relações interpessoais amorosas de natureza poligâmica, em que se defende a possibilidade de relações íntimas e duradouras com mais de um parceiro simultaneamente.
No plano dos afetos ou gostos ou preferências não discutimos o poliamor.
Resta saber se esse tipo de relação múltipla pode ou não gerar efeitos jurídicos e efeitos na órbita do direito de família.
Que dois casamentos não podem ser havidos como válidos, aí não vai qualquer dúvida, havendo configuração de bigamia. A bigamia acarreta a nulidade do segundo casamento (Código Civil, artigo 1.548, inciso II, c/c artigo 1.521, inciso VI). A bigamia é crime, com imposição de pena de reclusão, de dois a seis anos, para aquele que contrai novo casamento, já sendo casado (Código Penal, artigo 235, caput) e pena de reclusão ou detenção, de um a três anos, para aquele que, não sendo casado, contrai casamento com pessoa casada, conhecendo essa circunstância (Código Penal, artigo 235, parágrafo 1º).
Indaga-se, então, como poderiam ser atribuídos efeitos jurídicos e direitos à relação concubinária que concorre com o casamento. Poder-se-ia atribuir natureza de união estável a essa relação extraconjugal?
Também é de indagar como poderiam ser atribuídos efeitos jurídicos à relação que concorre com uma união estável. Poder-se-ia atribuir natureza de união estável a duas uniões concomitantes?
O casamento e a união estável, no plano do direito de família, são relações monogâmicas.
Em nosso ordenamento jurídico, assim como em nossa sociedade, não é admitida a poligamia, não sendo possível o reconhecimento de efeitos de união estável na relação extrafamiliar, ou seja, nas relações concubinárias.
De acordo com o artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição Federal, a união estável é entidade familiar equiparada ao casamento, de modo que, assim como não é possível que uma pessoa mantenha dois casamentos, juridicamente também não é possível que viva em casamento e em união estável concomitantemente, assim como não possível que uma pessoa viva duas uniões estáveis concomitantes:
“A união estável tem natureza monogâmica, sendo incabível o reconhecimento de duas uniões concomitantes como relações de família, desse modo, a relação que concorre com o casamento em que os cônjuges mantêm vida em comum chama-se concubinato, nos termos do artigo 1.727 do Código Civil, e não recebe a proteção do direito de família (...) Essa relação concubinária não gera os efeitos da união estável, como reconhece nossa melhor jurisprudência (...) Em suma, as relações adulterinas não tem as repercussões pessoais e patrimoniais das uniões estáveis, pois não constituem família e não recebem a respectiva proteção especial” (MONTEIRO, Washington de Barros e TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Curso de Direito Civil, vol. 2: direito de família. 42ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 63/64, 68 e 71).
O artigo 1.723, do Código Civil, estabelece:
“É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. parágrafo 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do artigo 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente”.
Assim, somente diante de separação de fato no casamento ou de dissolução da união estável, é que pode ser constituída outra união estável.
A relação que concorre com casamento ou com união estável somente pode caracterizar concubinato, nos termos do artigo 1.727 do Código Civil: “As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constitui concubinato”.
O Supremo Tribunal Federal distingue a união estável do concubinato:
“Companheira e concubina – distinção. Sendo o Direito uma verdadeira ciência, impossível é confundir institutos, expressões e vocábulos, sob pena de prevalecer a babel. União estável – proteção do Estado. A proteção do Estado à união estável alcança apenas as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato (...) Percebe-se que houve um envolvimento forte, projetado no tempo – 37 anos –, dele surgindo prole numerosa – nove filhos -, mas que não surte efeitos jurídicos ante a ilegitimidade, ante o fato de haver sido mantido o casamento com quem Valdemar contraíra núpcias e tivera onze filhos (...) No caso, vislumbrou-se união estável, quando, na verdade, verificado simples concubinato, conforme pedagogicamente previsto no artigo 1.727 do Código Civil. (...) O concubinato não se iguala à união estável referida no texto constitucional, no que esta acaba fazendo as vezes, em termos de consequências, do casamento. Tenho como infringido pela Corte de origem o parágrafo 3º do artigo 226 da Constituição Federal, razão pela qual conheço e provejo o recurso para restabelecer o entendimento sufragado pelo Juízo na sentença prolatada” (STF, RE 397.762/BA, 1ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 3.6.2008).
Cita-se, a seguir, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, no mesmo sentido da inexistência de efeito jurídico na relação que concorre com o casamento:
“Ser casado constitui fato impeditivo para o reconhecimento de uma união estável. Tal óbice só pode ser afastado caso haja separação de fato ou de direito. Ainda que seja provada a existência de relação não eventual, com vínculo afetivo e duradouro, e com o intuito de constituir laços familiares, essa situação não é protegida pelo ordenamento jurídico se concomitante a ela existir um casamento não desfeito (...) Diante disso, decidiu-se que havendo uma relação concubinária, não eventual, simultânea ao casamento, presume-se que o matrimônio não foi dissolvido e prevalecem os interesses da mulher casada, não reconhecendo a união estável.” (STJ, REsp 1.096.539/RS, 4 Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 27/3/2012).
“(...) Inicialmente, necessário consignar que é incontroverso que E. P. P. e A. L. V. mantiveram relacionamento concubinário por 31 anos, a partir de 1971, até a morte do de cujus, em 2002, e que dele resultou o nascimento de dois filhos (...). Contudo, a jurisprudência atual desta Corte firmou que a relação concubinária simultânea com casamento em que permanece efetivamente a vida comum entre marido e mulher, não gera direito à indenização, por incompatibilidade do reconhecimento de uma união estável de um dos cônjuges em relação a terceira pessoa (...)” (STJ. REsp 874.443/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 24/08/2010).
“(...) Com mais razão, a distinção entre casamento e união estável, de um lado, e concubinato, de outro, restou mais acentuada com a vigência do atual Código Civil, tendo em vista a expressa separação realizada no artigo 1.727, o qual, após listar as garantias dos conviventes em união estável, silencia em relação ao concubinato (...) Quisesse o Código Civil atribuir algum direito patrimonial ao concubino, assim teria o feito, e como também é silente a Constituição Federal, não se há, deveras, reconhecer direito patrimonial ao concubino, quanto mais em maior escala que ao cônjuge.(...).Com efeito, por qualquer ângulo que se analise a questão, a concessão de indenizações nessas hipóteses testilha com a própria lógica jurídica adotada pelo Código Civil de 2002, protetiva do patrimônio familiar, dado que a família é a base da sociedade e recebe especial proteção do Estado (artigo 226 da CF/88), não podendo o Direito conter o germe da destruição da própria família.(....)” (STJ. REsp 988.090/MS, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 02/02/2010).
“(...) para a caracterização da relação de companheirismo, é indispensável a ausência de óbice para o casamento, a teor do artigo 1.723, parágrafo 1º, do Código Civil, exigindo-se, no mínimo, que os companheiros detenham o estado civil de solteiros, viúvos, ou separados, nesse último caso, judicialmente ou de fato. (...) Frente a esse quadro, não há como atribuir ao relacionamento extraconjugal de que se cuida na espécie, mesmo em se tratando de uma relação de longa data, a proteção conferida ao casamento e estendida ao instituto da união estável, a fim de se permitir a concessão do benefício previdenciário” (STJ, REsp 1.142.584/SC, 6ª Turma, Rel. Min. Haroldo Rodrigues, j. 01/12/2009).
(...) Na orientação do STJ, a regra proibitiva é no sentido de vedar a designação de concubino como beneficiário de seguro, com a finalidade assentada na necessária proteção do casamento, instituição a ser preservada e que deve ser alçada à condição de prevalência, quando em contraposição com institutos que se desviem da finalidade constitucional. A união estável, também reconhecida como entidade familiar, pelo parágrafo 3º do artigo 226 da CF/88, tem tutela assegurada e o concubinato, paralelo a ambos os institutos jurídicos – casamento e união estável –, enfrenta obstáculos à geração de efeitos dele decorrentes (...)” (STJ. REsp 1.047.538/RS, 3ª T., Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04/11/2008).
Os artigos 2º, inciso II, e 7º da Lei nº 9.278, de 1996, e o artigo 1.694, do Código Civil de 2002, instituíram uma nova fonte de aquisição de direito a alimentos: a união estável. Por isso tais dispositivos legais não se aplicam ao caso dos autos, pois trata de relação concubinária, estabelecida, portanto, em paralelo ao casamento” (STJ. AgRg no Ag 670.502/RJ, 3ª T., Rel. Min. Ari Pargendler, j. 19/06/2008).
“No processo ora em julgamento, o falecido manteve relacionamento concubinário com a recorrida ao longo de 16 anos enquanto permanecia casado com a recorrente, desde 1958 até vir a óbito, sem nenhuma indicação de separação de fato. Dessa forma, não poderia o Tribunal de origem ter reconhecido a existência de união estável entre o falecido e a recorrida exatamente porque alicerçada referida união em impedimento matrimonial pré e coexistente, em absoluta similitude com o julgado colacionado. (...) Os elementos probatórios, portanto, atestam a simultaneidade das relações conjugal e de concubinato, o que impõe a prevalência dos interesses da recorrente, cujo matrimônio não foi dissolvido, aos alegados direitos subjetivos pretendidos pela concubina, pois não há, sob o prisma do Direito de Família, prerrogativa da recorrida à partilha dos bens deixados pelo falecido. (...) não há como ser conferido o status de união estável a relação concubinária simultânea a casamento válido (...)” (STJ, REsp 931.155/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 07/08/2007).
“(...) Realmente, não há como se admitir a coexistência de um casamento nas circunstâncias ora expostas (sem separação de fato) com uma união estável, sob pena de viabilizar a bigamia, já que é possível a conversão da união estável em casamento (...)” (STJ, REsp 684.407/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ de 27/6/2005).
Também está consolidada a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que nega efeito jurídico à relação paralela à união estável:
“(...) no tocante ao mérito da controvérsia, este Tribunal Superior consagrou o entendimento de ser inadmissível o reconhecimento de uniões estáveis paralelas. Assim, se uma relação afetiva de convivência for caracterizada como união estável, as outras concomitantes, quando muito, poderão ser enquadradas como concubinato (...)” (STJ. AgRg no Ag 1130816, 3ª T., Rel. Min. Vasco Della Giustina, j. 27/08/2010).
“Cinge-se a lide a definir, sob a perspectiva do Direito de Família, a respeito da viabilidade jurídica de reconhecimento de uniões estáveis simultâneas. (...) uma sociedade que apresenta como elemento estrutural a monogamia não pode atenuar o dever de fidelidade – que integra o conceito de lealdade – para o fim de inserir no âmbito do Direito de Família relações afetivas paralelas e, por consequência, desleais, sem descurar que o núcleo familiar contemporâneo tem como escopo a busca da realização de seus integrantes, vale dizer, a busca da felicidade. (...) Ao analisar as lides que apresentam paralelismo afetivo, deve o juiz, atento às peculiaridades multifacetadas apresentadas em cada caso, decidir com base na dignidade da pessoa humana, na solidariedade, na afetividade, na busca da felicidade, na liberdade, na igualdade, bem assim, com redobrada atenção ao primado da monogamia, com os pés fincados no princípio da eticidade. Emprestar aos novos arranjos familiares, de uma forma linear, os efeitos jurídicos inerentes à união estável implicaria julgar contra o que dispõe a lei. Isso porque o artigo 1.727 do CC/02 regulou, em sua esfera de abrangência, as relações afetivas não eventuais em que se fazem presentes impedimentos para casar, de forma que só podem constituir concubinato os relacionamentos paralelos a casamento ou união estável pré e coexistente. (...)” (STJ, REsp 1.157.273/RN, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 18/05/2010).
Em relações concubinárias, concorrentes com o casamento ou com a união estável, em nossos dias, em razão das redes sociais, da proximidade virtual das pessoas, dos meios de comunicação e transporte, nem mesmo tem cabimento falar em relação putativa, ou seja, em boa fé do terceiro ou da terceira que convive com alguém casado ou que vive em união estável. Como uma mulher que conviva com um homem casado pode desconhecer por longo tempo esse casamento? Como um homem que se relacione com uma mulher que mantem uma união estável pode alegar desconhecimento sobre essa união?
Embora excepcionalmente, quiçá para que quem viva em local sem comunicação ou meio de transporte, isso seja possível, mas, em regra, certamente não o é.
Embora a putatividade em bigamia, ou seja, na nulidade de casamento celebrado em concomitância com outro casamento tenha previsão legal (Código Civil, artigo 1.561, parágrafo 1º), essa regra é de absoluta excepcionalidade prática em nossos dias. Além dos mais, o casamento é havido como nulo.
Somente efeitos obrigacionais, de sociedade de fato, quando houver, o que não se confunde com favores sexuais, pode ter a relação extrafamiliar, mas para isso, nos termos do Código Civil, arts. 986 e ss., é preciso provar que houve efetivo aporte de capital ou trabalho que contribuiu na formação de patrimônio que fica em nome da outra pessoa. Depois dessa prova, serão avaliados os direitos do sócio de fato. Mas, aqui, mais uma restrição legal: a sociedade de fato não se prova somente por testemunhas, é necessário que haja prova escrita nos termos do artigo 987 do Código Civil.

Está em tramitação no STF o RE 669.465/ES, que decidirá sobre a existência ou não de direitos previdenciários no concubinato. Por enquanto, o Supremo Tribunal Federal somente reconheceu a repercussão geral da questão constitucional suscitada. Espera-se que a Suprema Corte tome a decisão que melhor preserva a família brasileira, conforme os ditames constitucionais.

Fonte: http://dimitresoares.blogspot.com.br/

ATIVIDADE DE DIREITO CIVIL - SUCESSÃO

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