MENDES, Regina
Lúcia Teixeira. Representações dos juízes sob o princípio do livre
convencimento do juiz e outros princípios correlatos. LIMA, Roberto Kant de;
EIBAUM, Lúcia; PIRES, Lenin (orgs.). Conflitos, direitos e moralidades em
perspectiva comparada. v. 2. Rio de
Janeiro: Garamond, 2010, pp.187-209.
_____________________________________________
Paulo César
Gomes dos Santos
Matricula
2010204118
Aluno
Bacharelando em Direito - FIS
No artigo de Regina Lúcia Teixeira Mendes, “Representações dos juízes
sob o principio do livre convencimento do juiz e outros princípios correlatos”,
o livre convencimento do juiz é visto como um fenômeno de raízes múltiplas,
tendo como substrato razões de cunho político, social, econômico e doutrinário.
É de suma importância uma prévia exposição das mencionadas origens do
poder de decisão jurisdicional, para que sejam verificadas as problemáticas
inerentes ao objeto e as diferentes compreensões do processo, com o intuito de
obter uma descrição válida da evolução recente das relações entre judiciário e
sociedade.
O desenvolvimento histórico das escolas hermenêuticas tem sido visto
como um dos fenômenos desencadeadores da chamada “revolta contra o formalismo”.
Da filosofia racionalista à interação do Direito com a sociologia, evolui-se na
forma de interpretação jurídica e na inevitável criação jurisprudencial.
O auge dessa crítica ao uso da lógica pura e mecânica no processo
jurisdicional, passando pelo sistema histórico-evolutivo e o da livre
investigação do direito, é representado pelo movimento do Direito Livre, de
Eugen Ehrlich e Hermann Kantorowicz.
Tal evolução representa uma das faces que elucidam o surgimento do
princípio do livre convencimento dos juízes. François Geny ensina que a função
judicial é que dá vida ao Direito, avançando sempre, a partir das leis, mas
muito além delas, para Mendes “o campo do Direito brasileiro permite vasta
exploração” (2010, p.191).
A questão da sentença fundamentada é importante ponto de partida. Sendo
abordada ora como ato volitivo, dependente de conhecimento (Kelsen) –
representando uma das cabíveis interpretações da norma (voluntas lex) –,
ora como ato que carrega necessária fundamentação a ser absorvida por um
processo dialético (Tópica de Viehweg), a decisão judicial é objeto que recebe
a atenção especial no desenvolvimento da hermenêutica jurídica.
Outro aspecto corresponde à grande transformação do Estado na moderna
“sociedade do bem-estar” (welfare state), desempenhando um papel
importante na defesa de direitos pela técnica que os cientistas políticos
denominam “promocional”, consistente em elaborar programas que visem um
desenvolvimento material dos direitos, desvencilhando-se do tradicionalismo que
impunha à legislação uma bipolaridade formal entre “certo” e “errado”, entre
“justo” e “injusto”.
Evitar-se-ia assim, de forma mais
efetiva, a inefetividade das leis: os direitos sociais passam a tomar a forma
de princípios gerais, exigindo dos juízes uma participação mais ativa em sua
aplicação. Como justificativa a esse caráter abstrato da lei, apresenta-se o
alto grau de mutabilidade das relações sociais.
Segundo Mendes “é importante frisar que as categorias articuladas do
principio do livre convencimento do juiz mudam de um discurso para” (2010,
p.192). Em que pese à afirmação do livre convencimento do juiz, cabe ressaltar
a relevância das ulteriores limitações às suas conquistas, decorridas durante o
início do século XX.
Na busca por uma interpretação unificada, tendo em vista a segurança
jurídica e fatores sociais, há em determinados sistemas hierárquicos judiciais,
em especial no sistema da lei comum, uma vinculação aos precedentes
jurisprudenciais oriundos das cortes superiores.
Estes precedentes vinculam os juízes em certas matérias, obrigando-os a
decidir de forma condizente com entendimentos pré-existentes. Tal forma
administrativa de controle das decisões pode vir a implicar choque com as
diferentes atribuições da liberdade do magistrado, impedindo a aproximação do
juiz com a realização da justiça no caso concreto.
Contudo, não implica em seqüestro de sua independência, mas apenas numa
possível reformulação de decisões.
Uma discussão importante diz respeito às confusões entre a “verdade dos
fatos” e a “verdade real”:
No Direito brasileiro, a “verdade dos fatos” é entendida como uma
“verdade real”, existente a priori, ainda que desconhecida, o que justifica uma
investigação minuciosa a seu respeito, uma vez que,como já foi visto, na nossa
sensibilidade jurídica a realização da justiça dependente da descoberta da
“verdade real” (MENDES, 2010, p.199).
Conclui-se, pois, que a “verdade real” é uma verdade autorrevelada, uma
verdade dada, concebida pela formação do convencimento do juiz e por sua
autoridade no processo.
O choque entre o princípio da segurança e o dinamismo jurídico das
reformas representa a essência da questão, ocupando papel semelhante nos
sistemas jurídicos “common law” e “civil law”. Utilizando como panorama a
importação pelo sistema jurídico brasileiro de formas de limitação substancial
ao livre convencimento do juiz, ressalta-se um possível retrocesso de
conquistas trazidas pelo princípio do livre convencimento, assim como o
potencial aumento do poder das limitações substanciais, até então tidas como de
pequeno alcance vinculador, frente aos limites processuais.
As decisões judiciais, dada a variação de entendimento relativos ao
livre convencimento, geralmente provoca a distribuição desigual de justiça para
jurisdicionados que experimentam conflitos semelhantes em suas vidas cotidianas
(MENDES, 2010). Nesta questão é importante ressaltar que a valorização das
representações que fazem sobre atos de decidir, se, por um lado, os deixa em
uma posição solitária, por outro reafirma a supremacia do seu poder no campo.