Processo Número:
0737/05
Quem
Pede: José de
Gregório Pinto
Contra
quem: Lojas
Insinuante Ltda, Siemens Indústria Eletrônica S.A e Starcell Computadores e
Celulares.
Vou
direto ao assunto.
O
marceneiro José de Gregório Pinto, certamente pensando em facilitar o contato
com sua clientela, rendeu-se à propaganda da Loja Insinuante de Coité e comprou
um telefone celular, em 19 de abril de 2005, por suados cento e setenta e quatro
reais.
Leigo
no assunto, é certo que não fez opção por fabricante. Escolheu pelo mais barato
ou, quem sabe até, pelo mais bonitinho: o tal Siemens A52. Uma
beleza!
Com
certeza foi difícil domar os dedos grossos e calejados de marceneiro com a
sensibilidade e recursos do seu Siemens A52, mas o certo é que utilizou o
aparelhinho até o mês de junho do corrente ano e, possivelmente, contratou
muitos serviços. Uma maravilha!
Para
sua surpresa, diferente das boas ferramentas que utiliza em seu ofício, em 21 de
junho, o aparelho deixou de funcionar. Que tristeza: seu novo instrumento de
trabalho só durou dois meses. E olha que foi adquirido legalmente nas Lojas
Insinuante e fabricado pela poderosa Siemens.....Não é coisa de segunda-mão,
não! Consertado, dias depois não prestou mais... Não se faz mais conserto como
antigamente!
Primeiro
tentou fazer um acordo, mas não quiseram os contrários, pedindo que o caso fosse
ao Juiz de Direito.
Caixinha
de papelão na mão, indicando que se tratava de um telefone celular, entrou seu
Gregório na sala de audiência e apresentou o aparelho ao Juiz: novinho, novinho
e não funciona. De fato, o Juiz observou o aparelho e viu que não tinha um
arranhão.
Seu
José Gregório, marceneiro que é, fabrica e conserta de tudo que é móvel. A
Starcell, assistência técnica especializada e indicada pela Insinuante, para
surpresa sua, respondeu que o caso não era com ela e que se tratava de “placa
oxidada na região do teclado, próximo ao conector de carga e microprocessador.”
Seu Gregório: o que é isto? Quem garante? O próprio que diz o defeito
diz que não tem conserto....
Para
aumentar sua angústia, a Siemens disse que seu caso não tinha solução neste
Juizado por motivo da “incompetência material absoluta do Juizado Especial
Cível – Necessidade de prova técnica.” Seu Gregório: o que é isto? Ou o
telefone funciona ou não funciona! Basta apertar o botão de ligar. Não acendeu,
não funciona. Prá que prova técnica melhor?
Disse
mais a Simens: “o vício causado por oxidação decorre do mau uso do
produto.” Seu Gregório: ora, o telefone é novinho e foi usado apenas para
falar. Para outros usos, tenho outras ferramentas. Como pode um telefone
comprado na Insinuante apresentar defeito sem solução depois de dois meses de
uso? Certamente não foi usado material de primeira. Um artesão sabe bem disso.
O
que também não pode entender um marceneiro é como pode a Siemens contratar um
escritório de advocacia de São Paulo, por pouco dinheiro não foi, para dizer ao
Juiz do Juizado de Coité, no interior da Bahia, que não vai pagar um telefone
que custou cento e setenta e quatro reais? É, quem pode, pode! O advogado
gastou dez folhas de papel de boa qualidade para que o Juiz dissesse que o caso
não era do Juizado ou que a culpa não era de seu cliente! Botando tudo na conta,
com certeza gastou muito mais que cento e setenta e quatro para dizer que não
pagava cento e setenta e quatro reais! Que absurdo!
A
loja Insinuante, uma das maiores e mais famosas da Bahia, também apresentou
escrito de advogado, gastando sete folhas de papel, dizendo que o caso não era
com ela por motivo de “legitimatio ad causam”, também por motivo do
“vício redibitório e da ultrapassagem do lapso temporal de 30 dias” e que
o pobre do seu Gregório não fez prova e então “allegatio et non probatio
quasi non allegatio.”
E
agora seu Gregório?
Doutor
Juiz, disse Seu Gregório, a minha prova é o telefone que passo às suas mãos!
Comprei, paguei, usei poucos dias, está novinho e não funciona mais! Pode ligar
o aparelho que não acende nada! Aliás, Doutor, não quero mais saber de telefone
celular, quero apenas meu dinheiro de volta e pronto!
Diz
a Lei que no Juizado não precisa advogado para causas como esta. Não entende seu
Gregório porque tanta confusão e tanto palavreado difícil por causa de um
celular de cento e setenta e quatro reais, se às vezes a própria Insinuante faz
propaganda do tipo: “leve dois e pague um!” Não se importou muito seu
Gregório com a situação: um marceneiro não dá valor ao que não entende! Se não
teve solução na amizade, Justiça é para isso mesmo!
Está
certo Seu Gregório: O Juizado Especial Cível serve exatamente para resolver
problemas como o seu. Não é o caso de prova técnica: o telefone foi apresentado
ainda na caixa, sem um pequeno arranhão e não funciona. Isto é o bastante!
Também não pode dizer que Seu Gregório não tomou a providência correta, pois
procurou a loja e encaminhou o telefone à assistência técnica. Alegou e provou!
Além
de tudo, não fizeram prova de que o telefone funciona ou de que Seu Gregório
tivesse usado o aparelho como ferramenta de sua marcenaria. Se é feito para
falar, tem que falar!
Pois
é Seu Gregório, o senhor tem razão e a Justiça vai mandar, como de fato está
mandando, a Loja Insinuante lhe devolver o dinheiro com juros legais e correção
monetária, pois não cumpriu com sua obrigação de bom vendedor. Também, Seu
Gregório, para que o Senhor não se desanime com as facilidades dos tempos
modernos, continue falando com seus clientes e porque sofreu tantos dissabores
com seu celular, a Justiça vai mandar, como de fato está mandando, que a fábrica
Siemens lhe entregue, no prazo de 10 dias, outro aparelho igualzinho ao seu.
Novo e funcionando!
Se
não cumprirem com a ordem do Juiz, vão pagar uma multa de cem reais por
dia!
Por
fm, Seu Gregório, a Justiça vai dizer a assistência técnica, como de fato está
dizendo, que seu papel é consertar com competência os aparelhos que apresentarem
defeito e que, por enquanto, não lhe deve nada.
À
Justiça ninguém vai pagar nada. Sua obrigação é fazer
Justiça!
A
Secretaria vai mandar uma cópia para todos. Como não temos Jornal próprio para
publicar, mande pelo correio ou por Oficial de Justiça.
Se
alguém não ficou satisfeito e quiser recorrer, fique ciente que agora a Justiça
vai cobrar.
Depois
de tudo cumprido, pode a Secretaria guardar bem guardado o
processo!
Por
último, Seu Gregório, os Doutores advogados vão dizer que o Juiz decidiu
“extra petita”, quer dizer, mais do que o Senhor pediu e também que a
decisão não preenche os requisitos legais. Não se incomode. Na verdade, para ser
mais justa, deveria também condenar na indenização pelo dano moral, quer dizer,
a vergonha que o senhor sentiu, e no lucro cessante, quer dizer, pagar o que o
Senhor deixou de ganhar.
No
mais, é uma sentença para ser lida e entendida por um marceneiro.
Conceição do
Coité, 21 de setembro de 2005
Gerivaldo Alves
Neiva
Juiz