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quinta-feira, 26 de abril de 2012

Caso Inocêncio de Oliveira

O deputado federal Inocêncio de Oliveira (à esq.) utilizou dos serviços do Departamento Nacional de Obras contra a seca, no Nordeste, para perfurar poços no terreno de sua revendedora para lavar motocicletas; inocentado neste caso, foi condenado em outro. As águas de março no Sudeste desabrigaram muitas famílias em fevereiro de 2010, uma tragédia, enquanto no mesmo período no Nordeste, principalmente no Piauí, a seca castigou as famílias que ficaram sem uma gota água. O DNOCS (Departamento Nacional de Obras contra a Seca) foi obrigado a abrir as comportas de cinco barragens. A água serviu para ajudar no abastecimento de cerca de 80 mil pessoas no semi-árido piauiense. Situação de emergência, prejuízos para a agricultura, em mais uma seca do nordeste. Um quadro muito antigo no Brasil.

Em 2009, o DNOCS comemorou 100 anos de fundação, com um acervo “importantíssimo do semi-árido nordestino”. Apesar de Inocêncio Oliveira ter defendido a manutenção deste arquivo, quase perdido durante o governo de FHC, ficou também registrado, na história do DNOCS, o mau uso da verba pública. O departamento, criado para acabar com a seca do Nordeste, foi utilizado pelo deputado Inocêncio Oliveira e outros políticos para benefício próprio.


A reportagem “A Indústria da miséria”, da revista Veja, de 21/04/1993, denunciou que a indústria da seca continuava a castigar milhares de pessoas em cidades sem serviço de saúde pública, como ainda sofrem hoje, quase 20 anos depois da reportagem moradores de Recife/PE. O fato era que o DNOCS, estava perfurando três poços nas terras do deputado Inocêncio Oliveira, quando era o presidente da Câmara Federal, em Brasília, pelo PFL-PE.

De fato, a legislação permite que o DNOCS, uma autarquia, perfure poços em terras de proprietários particulares, desde que as obras sejam prioritárias. “Difícil acreditar que o poço aberto na revendedora de motocicletas de Inocêncio, em Serra Talhada, seja prioritário, já que a água serve para lavar máquinas em vez de matar a sede das 3.000 vítimas da sede que vivem na região,” estampou a página de Veja. Serra Talhada, a 400 quilômetros do Recife, é terra natal do deputado Inocêncio, lugar onde ele manda e desmanda.

O assunto virou notícia e foi parar no Congresso Nacional, mas a maioria da Câmara dos Deputados achou que os poços de Inocêncio não tinham nada demais. O deputado se defendia dizendo que “os poços tinham função social”.

Segundo Veja, “o presidente da Casa explicou-se, o deputado Fernando Lyra, da corregedoria da Câmara, decretou que a denúncia contra Inocêncio era inepta, e o caso foi encerrado”. Mas uma pergunta ficou no ar: precisava o deputado federal Inocêncio Oliveira recorrer aos preços subsidiados do DNOCS para perfurar poços?

Médico por formação, o deputado tem um hospital, uma emissora de televisão, três de rádio, uma concessionária Honda, nove fazendas que totalizam 9.000 hectares de área, 1.600 cabeças de gado que produzem 1.000 litros de leite
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por dia, dois apartamentos, uma casa e um avião, que leva dois pilotos e quatro passageiros – dados de 1993.

A seca do Nordeste ainda não foi resolvida, segundo a reportagem da revista, “porque há gente que ganha com ela. Sempre funcionou como a matéria-prima de um ciclo vicioso que conserva economias de oligarcas e amamenta políticos fisiológicos”. São políticos bem-sucedidos que nada fazem para melhorar o estado de onde nasceram.

No caso dos poços de água, outros políticos nordestinos também foram beneficiados pelos serviços do DNOCS: três deputados estaduais, dois vereadores, o ex-prefeito do Recife José do Rego Maciel, pai do senador Marco Maciel, e dois senadores: Ney Maranhão, da tropa de choque do ex-presidente Fernando Collor de Mello, e o ex-senador Mansueto de Lavor.

O ex-senador Ney Maranhão queria a água do DNOCS para matar a sede de 200 cabeças de gado que criava em Vitória do Santo Antão. O ex-senador Mansueto de Lavor, relator da Comissão de Orçamento do Congresso, ainda reclamou da demora da implantação do serviço em sua fazenda.

Na mesma época, na Paraíba, o governador Ronaldo Cunha Lima, mandou derrubar as cercas que separavam os 186 açudes da população pobre. É que os tais açudes foram construídos, com dinheiro público, em terras de grandes fazendas, e estavam fechados por cercas para impedir o acesso da população.

Anos depois, em 2006, o deputado federal Inocêncio Oliveira (PL-PE), que era o primeiro secretário da Câmara, foi denunciado ao Supremo Tribunal Federal pelo então procurador-geral da República Cláudio Fonteles (inquérito 2054) por crime de aliciamento de trabalhadores e redução deles à condição de “escravos”. O deputado foi condenado pelo Tribunal Regional do Trabalho, da 16ª Região/Maranhão, a pagar uma indenização de R$ 300 mil por uso de trabalho escravo em sua fazenda de Caraíbas, no município de Gonçalves Dias/MA, a 348 km de São Luís.

A fazenda Caraíbas
- Conforme relatou o site JusBrasil, em 07/11/2003, a propriedade possuia 4.200 hectares e 3 mil cabeças de gado. A alimentação dos trabalhadores era insuficiente e inadequada, a água não potável consumida era retirada de um açude também utilizado pelo gado da fazenda. O alojamento feito pelos próprios trabalhadores era coberto de palha e lona plástica com piso de terra batida, sem instalações sanitárias e local adequado para refeições.

Na sentença, o juiz Manoel Lopes Veloso Sobrinho, de Barra do Corda, no Maranhão, destacou que "na avaliação do quanto a ser reparado, ganha maior relevo a circunstância de o réu ser um homem público, parlamentar de vários mandados, exercendo atualmente mandato de Deputado Federal, ocupando a 1ª Vice-Presidência da Mesa da Câmara dos Deputados, e por essa razão maior, ser-lhe cobrado uma conduta exemplar no trato com seus subordinados (grifo do original)."

O caso aconteceu em 2002, quando foram libertadas 53 pessoas mantidas como escravos na sua fazenda. O caso foi encampado pelo Ministério Público do Trabalho e pela Procuradoria Geral da República. Os trabalhadores “escravos” vinham da cidade de União, no Piauí, município com altos índices de aliciamento por “gatos” - contratadores de mão-de-obra a serviço do fazendeiro. Os tais “trabalhadores que dão duro como mão-de-obra barata na hora de trabalhar, depois viram curral eleitoral na hora de votar.”
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Inocêncio vendeu a propriedade no Maranhão, mas a medida não o livrou de constar na primeira “lista suja” do trabalho escravo. Entre novembro de 2003 e novembro de 2005, ele ficou impedido de receber créditos de bancos e agências públicas de financiamento. Mas, Inocêncio Oliveira saiu vitorioso do julgamento: “Os desembargadores reconheceram que não havia trabalho escravo, mas sim trabalho degradante, figura não prevista na legislação trabalhista.”

O juiz Manoel Sobrinho, assinalou na sua sentença, que além das provas testemunhais e documentais, as fotografias juntadas aos autos comprovaram os fatos. "De todo o conteúdo probatório," escreveu o juiz, "restou presente o trabalho prestado sob condições análogas à de escravo. Desde o aliciamento de trabalhadores à sua servidão por dívidas (o cativeiro da dívida), passando pelas péssimas condições de trabalho, moradia, alimentação, etc., ficando os obreiros tolhidos da sua liberdade de ir e vir enquanto pendente débito contraído perante o próprio empregador.

Nesse tocante, são dispensáveis e mesmo onerosas manter vigilância armada ou cercas para impedir a fuga de trabalhadores, haja vista que é difícil o acesso ao local de trabalho, os obstáculos naturais são comuns, a fazenda distar em muito do local onde residiam os obreiros antes de serem aliciados, não dispunham de condução nem mesmo dinheiro para suportá-la. Parece ser uma engenharia inteligente de obtenção de mão-de-obra barata, no caso praticamente a custo-zero", concluiu o magistrado.

O deputado Inocêncio Oliveira pode recorrer da condenação pela indenização de R$ 530 mil. (Atualizada em 26/06/2011)


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