Por Paulo César Gomes, professor, escritor e pesquisador da história serra-talhadense


Poucos registros sobre a escravidão negra são encontrados na literatura pajeuzeira, muito se deve ao desinteresse dos pesquisadores pelo assunto ou pelo sigilo com as quais as fontes de pesquisas são “guardadas”. A maioria dos documentos sobre compra e venda de escravos no Sertão do Pajeú encontram-se sobre a proteção da Igreja Católica, mas precisamente na paróquia da cidade de Flores e na Diocese de Afogados da Ingazeira.

Todos os documentos que envolvem a escravidão no Brasil e em todo continente americano já deveriam estar disponíveis ao público, visto que o período foi tão horrendo quanto o Holocausto dos judeus na Segunda Guerra Mundial, e que por essa razão já deveria ser conhecido por toda a humanidade. A escravidão negra precisa ser estudada e, principalmente, repudiada para sempre.

No que se refere a nossa região, é preciso primeiro rever a ideia pregada por alguns escritores de que a escravidão não ocorreu com a violência da Zona da Mata. Para derrubar este teoria sem fundamento é preciso primeiro estudar alguns casos. O primeiro é a venda escrava Branda, um dos únicos registros sobre comércio escravista e que está publicado no livro ‘Caminhos do Homem’, escrito pelo ex-prefeito Luiz Lorena.

A negociata envolvendo a negra, que tinha mais de 18 anos e era solteira, ocorreu em 1876, e foi registrado em uma escritura pública no Cartório do tabelião Joaquim José dos Nascimento Wanderley, na Comarca de Flores. Branda pertencia a Antonio Xavier de Souza e foi comprada por José Lira Chaves Pessoa. O comprador pagou quinhentos mil réis.

Toda a transação foi registrada no livro contábil do Coletor, o capitão Benedicto Hortêncio de Siqueira Campos. Chama atenção no pequeno registro histórico a informação sobre os números que identificava a escrava, que possuía o número das ordens de relação, 356; número de ordem na matrícula, 172; e o a matricula no município era um.

Outro fato que chama bastante atenção é um dos trechos da transcrição da escritura pública: “e que desde já poderá o comprador tomar posse da dita escrava, como sua que é e fica sendo de hoje em diante, pois aí lhe transferi todo o poder, jus e domínio que nela tinha” (Lorena, p.188).

O caso de Branda é só mais uma evidencia de que escravidão em Serra Talhada em todo o Pajeú foi praticada com todos os requintes de crueldade vistos nos grandes centros do país. Não é a toa que em Flores existia um Pelourinho, e em Serra Talhada foram construídas várias senzalas. E erguida, com o uso da mão de obra escrava, uma das únicas Igrejas do Rosários dos Pretos do interior do Nordeste.


Ilustração reproduzida do livro de Luiz Lorena "Caminhos do Homem"