Uma sertaneja amoleceu o coração de pedra do Rei do Cangaço. Foi Maria
Gomes de Oliveira, a Maria Déa, também conhecida como Maria Bonita. Separada do
antigo marido, o sapateiro José Miguel da Silva, o Zé de Neném, foi a primeira
mulher a entrar no cangaço. Antes dela, outros bandoleiros chegaram a ter
mulher e filhos, mas nenhuma esposa até então havia ousado seguir o companheiro
na vida errante no meio da caatinga.
O primeiro encontro entre os dois foi em
1929, em Malhada de Caiçara (BA), na casa dos pais de Maria, então com 17 anos
e sobrinha de um coiteiro de Virgulino. No ano seguinte, a moça largou a
família e aderiu ao cangaço, para viver ao lado do homem amado. Quando soube da
notícia, o velho mestre de Lampião, Sinhô Pereira, estranhou. Ele nunca
permitira a presença de mulheres no bando.
Imaginava que elas só trariam a
discórdia e o ciúme entre seus “cabras”. Mas, depois da chegada de Maria Déa,
em 1930, muitos outros cangaceiros seguiram o exemplo do chefe. Mulher
cangaceira não cozinhava, não lavava roupa e, como ninguém no cangaço possuía
casa, também não tinha outras obrigações domésticas. No acampamento, cozinhar e
lavar era tarefa reservada aos homens.
Elas também só faziam amor, não faziam a
guerra: à exceção de Sila, mulher do cangaceiro Zé Sereno, não participavam dos
combates – e com Maria Bonita não foi diferente. O papel que lhes cabia era o
de fazer companhia a seus homens. Os filhos que iam nascendo eram entregues
para ser criados por coiteiros. Lampião e Maria tiveram uma filha, Expedita,
nascida em 1932. Dois anos antes, aquele que seria o primogênito do casal
nascera morto, em 1930.
Entre os casais, a infidelidade era punida dentro da
noção de honra da caatinga: o cangaceiro Zé Baiano matou a mulher, Lídia, a
golpes de cacete, quando descobriu que ela o traíra com o colega Bem-Te-Vi.
Outro companheiro de bando, Moita Brava, pegou a companheira Lili em amores com
o cabra Pó Corante. Assassinou-a com seis tiros à queima-roupa. A chegada das
mulheres coincidiu com o período de decadência do cangaço. Desde que passou a
ter Maria Bonita a seu lado, Lampião alterou a vida de eterno nômade por
momentos cada vez mais alongados de repouso, especialmente em Sergipe.
A
influência de Maria Déa sobre o cangaceiro era visível. “Lampião mostrava-se
bem mudado. Sua agressividade se diluía nos braços de Maria Déa”, afirma o
pesquisador Pernambucano de Mello. Foi em um desses momentos de pausa e idílio
no sertão sergipano que o Rei do Cangaço acabou sendo surpreendido e morto, na
Grota do Angico, em 1938, depois da batalha contra as tropas do tenente José
Bezerra. Conta-se que, quando lhe deceparam a cabeça, a mais célebre de todas
as cangaceiras estava ferida, mas ainda viva.
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